Prof. Dr Carlos Nuno Castel-Branco
Levantou-se um debate polémico em torno do nome da ponte sobre o Zambeze. Nem outra coisa seria de esperar, dados quatro factores: (i) o nome escolhido (o do Presidente da República, Armando Emílio Guebuza, controverso pelos seus métodos de governação e ligações activas com o mundo de negócios); (ii) o contexto político em que o nome foi escolhido (fim de mandato de uma governação absolutista, com um ambiente de crescente lambe-botismo e carreirismo e crescente culto de personalidade, conjugados com o ciclo eleitoral em que nos encontramos); (iii) a forma como a escolha foi feita (a única, ou uma das raríssimas sessões do Conselho de Ministros não presididas pelo PR neste mandato, em que foram rejeitadas opções claramente mais neutras e unificadoras sem qualquer justificação aceitável; seguida da declaração de irreversibilidade da escolha, a qual, por si só, é um reconhecimento de que existe um problema com a escolha); e (iv) o significado e o simbolismo histórico da travessia do Zambeze (esforço colectivo de gerações de Moçambicanos combatentes libertadores, simbolizando que enquanto o colonialismo tudo fez para impedir a travessia do Zambeze, os Moçambicanos livres e combatentes tudo fizeram para promover a justa e livre travessia desse majestoso Rio). Nas várias mensagens sobre o nome da ponte do Zambeze que já recebi, não há nada que justifique a atribuição do nome de Armando Emílio Guebuza (AEG) à ponte. Há uma cantilena sobre o significado da ponte, outra sobre os feitos recentes do grande timoneiro, mas não existe a mais pequena relação lógica entre as cantilenas e o nome da ponte. Provavelmente, para a maioria das pessoas o que interessa é que haja uma boa e sólida ponte e cada um usará o nome que quiser. No entanto, há algumas considerações que gostaria de fazer usando o debate sobre o nome desta ponte como pretexto. Historicamente, a travessia do Rio Zambeze tem sido fundamental na nossa vida. A travessia do Zambeze pelos guerrilheiros da FRELIMO foi um dos marcos fundamentais na construção da vitória sobre o colonialismo português. Por isso, até temos ruas, praças, escolas, etc., que se chamam “Travessia do Zambeze”. Mais uma vez, com a ponte a inaugurar em breve, a travessia do Zambeze será um marco histórico na unificação física do território nacional e na reafirmação e consagração da integridade territorial. Enquanto o colonialismo português tentou, com Cahora Bassa e com o colonato, impedir a travessia do orgulhoso rio Zambeze, a vitória do Povo Moçambicano permitiu a construção de uma ponte para facilitar e promover essa travessia. Essa vitória, construída por milhões de heróis, foi sendo erguida em torno de eventos históricos como a travessia do Zambeze para Sul. Portanto, a ponte sobre o Zambeze tem valor e simbolismo histórico que de longe ultrapassam o nome de qualquer pessoa viva ou morta. A ponte sobre o Zambeze estava inscrita nas directivas económicas e sociais do III Congresso, foi reafirmada no IV Congresso, planificada e orçamentada no mandato do governo anterior (1999-2004), executada no actual mandato (2005-2009). Portanto, se fosse dado um nome presidencial a essa ponte, acho que ela se deveria chamar “Eduardo Moisés Alberto Guebuza”. Portanto, ao contrário do que é afirmado por alguns, o AEG nao é o patrono da ponte. A epopeia da travessia do Zambeze não tem patrono individual – se tem patrono, este é colectivo, somos nós todos e tem sido a nossa luta pela nossa libertação do colonialismo, do fascismo, do apartheid, do racismo, da opressão, da repressão, da indignidade, do lambe-botismo, da “cunha”, da miséria; e pelo desenvolvimento com equidade e justiça social e sustentabilidade ambiental e intergeracional. Se existe, o patrono da ponte do Zambeze somos nós todos que lutámos e lutamos por Moçambique. Por outro lado, não é de bom gosto que o Presidente vivo e em exercício ande a pôr o seu nome, ou a permitir que outros o façam, em obras nacionais desta envergadura. O seu nome ficará ligado à ponte pois uma placa recordará as gerações vindouras de quem a inaugurou. Mas cai mal, fica mal, sabe mal e cheira mal atribuir o seu próprio nome à ponte. Politicamente, ele perde mais com isto do que ganha. A internet, os celulares, a imprensa, andam agora a gozar com isto. O gozo chega ao ponto de hoje qualquer coisa (desde o novo caixote de lixo imaginário produzido por uma metalo mecanica nacional até a ultima tenda hipotética de pipocas aberta em Tete) ser chamada AEG. Ate já há quem proponha chamar AEG a tudo e todos – todas as ruas, praças, escolas, centros de saúde, edifícios públicos, buracos nas estradas, capim nos jardins e pessoas. Assim já não haveria confusão nem discussão. Todo o Pais se chamaria AEG, seguindo o muito bom exemplo de regimes como o de Mobutu, onde cada Zairota já nascia membro do então chamado movimento revolucionário do Zaire. A dita Africanização do Zaire serviu para legitimar o culto da personalidade e o absolutismo do poder de um regime ilegítimo que se dizia anti-imperialista e nacionalista mas que era, na prática, fiel parceiro e servidor das multinacionais que dominaram aquele território e povo. Não penso que seja responsável e digno desgastar a imagem e a dignidade de um símbolo e de um órgão nacional. O PR é um símbolo e um órgão da República, e nesta a soberania é dos cidadãos. O PR não e uma pessoa qualquer que pode usar o seu nome, ou deixar que o usem, a torto e a direito. A tarefa do PR não é tentar, a todo o custo, ficar registado na história. O PR não é propriedade privada nem pessoal. É UM SÍMBOLO E UM ORGÃO DA REPÚBLICA. Como cidadãos desta República, será que nos sentimos bem quando o PR vivo e em exercício põe, ou quer por, ou permite que ponham, o seu nome em tudo, incluindo numa dita square (praça) situada no coração da “lavandaria” nacional de dinheiro sujo e, ao mesmo tempo, na ponte que traz consigo o significado e o simbolismo da epopeia da Travessia do Zambeze? Sentimos orgulho nisto? Sentimo-nos libertados, dignificados e com mais auto-estima com isto? Provavelmente, alguns de nós estão satisfeitíssimos; mas também é bem provável que muitos outros não estejam. Será que gostaríamos mesmo de ver AEG em todo o lado? Será que não nos preocupa saber que quando um cidadão assume funções de órgão da República tem o poder e a oportunidade para se esquecer dos princípios Republicanos, pessoalizar o poder, as obras e os símbolos da soberania dos cidadãos da República, e que depende dele, não dos outros órgãos democráticos da República, se tal cidadão usa (ou permite que outros usem) o poder que lhe é conferido pela República para benefício pessoal, sejam eles eleitoralista, de ego pessoal ou quaisquer outros? Será que sentimos orgulho e auto-estima quando o Conselho de Ministros se reúne para dar o nome do seu chefe em exercício a uma ponte, em vésperas de fim de mandato e do início de uma fase crítica do ciclo eleitoral, dando a entender que os membros do CM encontraram uma forma colectiva de tentar garantir os seus postos no próximo mandato (uma espécie de acordo colectivo de trabalho)? Será que usar as obras públicas para fim eleitoralistas ou de culto de personalidade nos alegra e satisfaz? É por isto que gerações e gerações de Moçambicanos lutaram e lutam? É por isto que continuamos a lutar hoje? Para não existirmos a não ser que o PR nos reconheça, para sermos apóstolos da desgraça a não ser que as nossas obras levem o nome do PR, a sermos alvos a abater (“…a destruir como o colonialismo foi destruído…”, como diz uma das cartas que recebi) por ousarmos não concordar, por ousarmos criticar e pensar diferente? Algumas das nossas tradições e crenças tornaram-nos confortáveis com, e dependentes da, omnipresença, omnisciência e omnipotência de algum ser divino. Em face da dúvida suscitada por nunca nenhum ser divino nos ter aparecido, apesar da sua omnipresença, acabamos atribuindo essas características a pessoas como nós, neste caso o PR da ocasião, seja ele quem for. Na última conferência de quadros do Partido Frelimo da era AEG, já se falava de omnipotência, omnisciência e omnipresença. Estes conceitos fazem parte da cultura da submissão ao divino e ao poder e do pragmatismo dos lambe-botas, mas são totalmente opostos à cultura da cidadania Republicana, democrática e socialista (em que o Partido Frelimo se diz inspirar). Será que isto não nos preocupa? Nós vivemos numa República, e a República e os seus cidadãos não se submetem a nada, a não ser às suas próprias leis e regras, produto da sua experiência e conflito histórico, social e político. Os cidadãos são os soberanos da República. Aliás, um Partido que diz identificar-se com o socialismo democrático deve saber que em democracia socialista a soberania é dos cidadãos trabalhadores da República socialista democrática, e não do patrão (no socialismo democrático republicano, o tal patrão nem deve existir). Além disso, a omnipresença, a omnisciência e a omnipotência sabem mal, cheiram mal e soam mal. Sabem, cheiram e soam a Gestapo, a PIDE, a BOSS/NIS, a Mobutu, a fascismo, a repressão, a opressão, a humilhação. O “patronismo” disto e daquilo assemelha-se à reclamação da paternidade da democracia que um pobre idiota nosso compatriota, e seu porta-voz, continuam a fazer. Ao contrário do proclamado por muitos, à direita e à esquerda, não há “fim da história” – só no fim do espaço/tempo, e isso levará vários biliões de anos a acontecer para o Universo corrente; pouco mais que um par de biliões de anos para o nosso sistema solar; e talvez alguns milhares de anos, se tivermos mais juízo do que até aqui, para a Humanidade terrestre. Nesse tempo, muita água passará em baixo da ponte e não me admiraria que ela, a ponte, mudasse de nome, particularmente se o seu nome original for AEG. Imaginemos a indignidade e vergonha causadas por uma resolução de um futuro Parlamento nacional, daqui a alguns anos, a alterar os nomes de obras nacionais para resgatar o seu real significado histórico e Republicano! Imaginemos a imprensa, nessa altura, a entrevistar o Felício Zacarias, já velhinho, e este a dizer a qualquer coisa do género “fomos obrigados a dar o nome, no contexto pensávamos assim, eu estava contra mas cumpri orientações, o novo nome resgata o nosso sentimento real da época mas naquela altura não nos podíamos opor; quando disse “irreversível” falava do sentido legal na época e não do sentido da dinâmica histórica”, e outras coisas que tais. Imaginemos! Fechemos os olhos, por um momento esqueçamos os deveres partidários de esfregar o poder nestas alturas críticas do ciclo político, e imaginemos daqui a alguns anos alguém a pensar para a sua máquina quântica pensante – que terá substituído os computadores tal como os conhecemos hoje – uma carta em que se lê: “...amo-te, ó histórica travessia do Zambeze que deste nome à ponte que nos uniu fisicamente”, (em vez do actual “…nós te amamos Armando Emílio Guebuza ponte”, que recebi numa carta, em que ambiguamente se usa a ponte para esconder a esfregadela ao divino AEG, ou se reforça a divindade do AEG atribuindo-lhe, também, a capacidade de ser ponte). “…amo-te, ó histórica epopeia libertadora geradora de heróis combatentes, indomáveis, insubmissos como tu, ó poderoso Zambeze que és livre como o pensamento soberano dos Homens que te atravessaram lutando pela liberdade; heróis, uns lembrados outros outrora esquecidos, como Cândido Jeremias Mondlane, mas hoje resgatados, que proporcionaram a primeira de muitas travessias libertadoras do teu leito, heróis que enfrentaram a tua força e nela se inspiraram e inspiram para gerarem o seu espírito indomável e insubmisso que, como tu, ó majestoso Zambeze que continuamente se renova, simboliza o que são os cidadãos da República socialista democrática de Moçambique…” (desculpem a minha total e completa ausência de veia poética, mas nunca tentei ter uma). Imaginem a ansiedade com que aguardo ouvir o que os vira-casacas de amanhã (lambe-botas de hoje) vão dizer para se justificarem. Ou como anseio o momento em que o Felício Zacarias vai finalmente aprender que nada neste mundo é irreversível (para além do tempo no espaço sobre o qual nem o AEG nem o CM – aliás, nem Einstein – têm controlo), nem mesmo a decisão de atribuir o nome do grande timoneiro à ponte do orgulhoso e majestoso Rio. E nessa altura, o cidadão AEG não estará aqui para esclarecer para todos nós ouvirmos bem que um grupo de puxa-sacos usou o seu nome em vão, e que ele nunca lhes disse para o fazerem. Para cortar curta uma história que já vai longa, chamar ponte AEG à do Zambeze cheira mal, soa mal, sabe mal, cai mal e parece mal. Parece, cheira, soa e sabe a culto de personalidade de baixa qualidade, e este cheira, sabe e soa a fascismo, a absolutismo monárquico, a violação grosseira e de mau gosto dos princípios Republicanos, da cidadania Republicana e do socialismo democrático; e cai como mais uma de muitas nódoas no pano já muito sujo que reflecte a imaginação “democrática” dos lambe-botas do nosso actual regime político. Fica mal usar o nome do PR, símbolo da soberania dos cidadãos da República, a torto e a direito, e em vão (e, mais provavelmente, sem a sua autorização) para dar nomes a pontes sobre rios majestosos, indomáveis e cheios de história como o Zambeze (além de ser também nome de uma square qualquer de um complexo comercial de origem duvidosa). Como dizia Nicolai Bukharine, então membro do Comité Central do Partido Comunista da Rússia, quando Estaline propôs um mausoléu para o corpo de Lenine e se visualiza a atribuição dos nomes Estalinegrado e Leninegrado a duas grandes cidades, “…um cheiro nauseabundo começa a penetrar no Comité Central do Partido:” Poucos anos depois, a grande purga Estalinista levou ao assassinato de milhões de comunistas militantes de causa justa e não carreirista (incluindo Bukharine) e de muitos outros cidadãos honestos, inovadores, trabalhadores que ousaram opor-se ao culto de divindade e às políticas repressivas do querido dirigente, que acreditaram que a República, principalmente a República socialista, deveria ser profundamente democrática e em total ruptura com o poder absolutista do Czar e de Estaline e dos seus aparelhos de propaganda e repressão. Os assassinatos em massa não pararam a história, nem o pensamento, o vento e a acção. Estaline e o seu tipo de regime estão hoje no seu devido local de repouso – o caixote de lixo da história. Não direi eternamente, porque a história não tem fim. Felizmente, não há machado que corte a raiz ao pensamento porque este é livre como o vento. Aliás, os combatentes da liberdade em Moçambique sabem muito bem que não se corta a raiz ao pensamento, que, como dizia Samora, não se para o vento com as mãos. O fascismo colonial e racista não travou o pensamento libertador; atiçou-o. É esse o sentido do belo poema de Armando Guebuza em que ele diz que as suas dores mais as nossas dores vão acabar com a opressão e conquistar a liberdade. Por mais nauseabundo que o cheiro possa ser num certo momento, o vento da história se encarregará de limpar o ar. E o vento da história é o produto de todos nós, inspirados, entre outros, pelos obreiros da primeira e das muitas outras Travessias do Zambeze. Nelson Mandela é uma pessoa cuja dignidade é, por enquanto, inquestionavelmente exemplar para todos nós. Particularmente, há dois momentos e processos, entre muitos outros, que marcam profundamente a forma como muitos para ele olham com admiração e respeito. Um, foi uma declaração que ele próprio fez, há muitos anos, pouco depois da sua libertação, em que disse que não era nenhum messias, mas apenas um combatente da liberdade, convicto e determinado, como tantos outros milhões de sul-africanos que ousaram lutar e ousaram vencer o apartheid. Outro, foi a sua extraordinária magnanimidade na vitória, contribuindo para criar um mundo em que a justeza da luta resulta em que todos ganham com a Vitória dos ideais justos dessa luta, mesmo os que tenham lutado contra esses ideais. Faz lembrar as palavras de Samora, que dizia que a nossa luta nos libertou a nós e aos próprios colonos e aos colonialistas. Ou as proféticas palavras de Jorge Rebelo, que dizem que não basta que a nossa luta seja justa, é necessário que a justiça viva dentro de nós. Como seria magnífico se no acto da inauguração da ponte o PR (símbolo e órgão da nossa República) fizesse justiça a todos os Moçambicanos que, lutando por Moçambique, contribuíram para a construção da ponte do Zambeze! Como seria glorioso, para AEG como cidadão político, que no acto da inauguração da ponte usasse a sua tendência para a omnisciência e omnipotência para declarar, alto e para todos nós ouvirmos bem, para todo o Mundo ouvir bem, que em nome dos cidadãos livres e soberanos da nossa República inspirada na epopeia libertadora e heróica de ontem e de hoje, a ponte ora inaugurada passaria a chamar-se “Ponte da Travessia do Zambeze” (ou ponte do Zambeze, ou ponte da Unidade Nacional). Aí estaria a ser reforçada a dignidade do PR como órgão da República e a magnanimidade do AEG como político de dimensão nacional e internacional. Aí, a intervenção do PR, AEG, estaria a unir todos nós na mesma vitória e no mesmo simbolismo histórico da segunda travessia do Zambeze. Aí, o PR, o político AEG, estaria a inaugurar uma ponte entre o passado glorioso e o futuro que se quer brilhante, mas também a indicar claramente que o nosso País é uma República em que o poder e a soberania pertencem aos cidadãos e não podem nunca ser pessoalizados ou usurpados para fins pessoais ou outros contrários aos princípios Republicanos democráticos. Aí estaria a ficar clara a isenção do PR em relação aos lambe-botismo dos que usam e abusam do seu nome e, por inerência, de um órgão da República, em vão. Aí, o lambe-botismo estaria a ser postos no seu lugar, o caixote do lixo da história. Mas, claro, estou imaginando que o PR gostaria, ele próprio, de fazer ou manifestar algo do género. Mas não estou totalmente seguro que esse seja o seu desejo. Que a historia a todos nos absolva. A Luta Continua, em prol dos princípios inalienáveis da República socialista democrática. Teu amigo e camarada, Carlos Nuno PS: Amigo e camarada, não me respondas evocando tradições Africanas que requerem um chefe omnipotente e omnipresente. Essas ditas tradições são criadas e instrumentalizadas para legitimar o ilegítimo, e já cheiram nauseabundamente mal. Foi esse tipo de tradições absolutistas e reaccionárias que abriu as portas para a nossa colonização. Também não me respondas dizendo que afinal é só um nome – se isso fosse verdade, então estaríamos a desafiar ainda mais do que imagino a dignidade do PR. Não me digas que outros Presidentes fizeram a mesma coisa – se a tarefa do actual é apenas repetir o que outros fizeram, então por que não deixar os outros lá em vez de eleger um novo? O que é que o novo traz de inovador ao País? Não me acuses de não ter intelectualizado suficiente a questão do ponto de vista de filosofia política. Nem sequer o quis fazer. Só quis mostrar dois pontos: se a ponte do Zambeze tem por trás de si o simbolismo histórico da epopeia libertadora da Travessia do Zambeze pelos guerrilheiros da FRELIMO, epopeia esta que não pode nem deve ser pessoalizada em ninguém, vivo ou morto, por ser uma epopeia colectiva de todo um Povo; por outro lado, o culto da personalidade tem por trás de si o absolutismo e à sua frente a tirania e oportunismo. Não me digas que não tenho legitimidade para me exprimir sobre estas questões como o fiz. Claro que tenho, pois sou cidadão livre e soberano desta República. Qualquer outra característica – etnia ou região de origem, tamanho dos olhos ou do nariz, cor da pele, forma de expressão, posição social ou cultural, altura ou largura, posição na hierarquia das listas oficiais de cidadãos – é completamente irrelevante quando comparada com a minha característica de cidadão livre e soberano desta República. Finalmente, de nada te vale acusares-me de ser da oposição (como hoje é moda). Primeiro, há uma diferença substancial entre “ser da oposição” e “estar na oposição”. Segundo, nas condições actuais nem é preciso mudar de Partido para estar na oposição. Terceiro, estar na oposição ao culto da personalidade e ao absolutismo e oportunismo a ele associados, e ser a favor da República socialista democrática são, para mim, motivos de enorme orgulho e auto-estima, e geradores de enorme e inesgotável energia. Quarto, ainda que eu fosse “da oposição”, não seria esse um direito inalienável que teria como qualquer cidadão, garantido pela Constituição e protegido pelo PR?
Um abraço.
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